JORNAL DA ILHA - Justiça
Ilha Solteira - A 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça começou a julgar nesta quinta-feira (20/3) se a União pode mudar o critério para calcular a indenização pela reversão de bens vinculados às concessões de usinas hidrelétricas anteriores à Lei 12.783/2013.
O caso concreto julgado é da antiga Cesp, que operou as usinas de Ilha Solteira e Jupiá, em São Paulo, mediante concessão até 2015 e não aceitou as condições impostas pelo governo para renovação. As hidrelétricas acabaram relicitadas por meio de leilão.
Pelo contrato, a empresa seria indenizada com base na parcela dos investimentos em bens que fez para operação das usinas e que ainda não foram amortizados ou depreciados.
O contrato previu esse cálculo pelo método do valor original contábil (VOC). Já a Lei 12.783/2013 estabeleceu que, nesses casos, a indenização deve obedecer o método do valor novo de reposição (VNR).
A diferença entre os dois é substancial. Pelo VOC previsto em contrato, a Cesp calcula que precisa receber R$ 914,7 milhões por Ilha Solteira e R$ 646,4 milhões por Jupiá, totalizando R$ 1,5 bilhão.
Já o método defendido pela União reduziria a quantia para módicos R$ 2 milhões, valor todo centrado em Ilha Solteira — a hidrelétrica de Jupiá não renderia qualquer indenização para a concessionária.
O Tribunal Regional Federal da 1ª Região deu razão à União e autorizou o uso do método alternativo, que não estava previsto no contrato de concessão. Ao STJ, a Cesp pediu a mudança da forma de cálculo.
Relator do recurso, o ministro Gurgel de Faria votou por atender ao pedido da empresa. O julgamento foi interrompido por pedido de vista do ministro Benedito Gonçalves.
Para Gurgel de Faria, o critério previsto no artigo 8º da Lei 12.783/2013 pode ser empregado para calcular a indenização por bens reversíveis de contratos anteriores à sua vigência, desde que não exista metodologia distinta prevista nesses documentos.
Isso porque essa mudança, à revelia do que as partes acordaram formalmente, anularia a garantia do ato jurídico perfeito e afetaria o equilíbrio econômico do contrato, dois temas que são garantidos pela Constituição Federal.
Autorizar a mudança representaria um precedente perigoso. Por essa lógica, a União poderia escolher índices de correção ou critérios para juros de mora para alterar contratos vigentes sob o pretexto de que mesmo os novos critérios servem ao mesmo fim: compensar a perda da moeda e a mora.
“O equilíbrio contratual não preserva apenas a manutenção abstrata do direito à indenização, mas também a observância integral das condições econômicas inicialmente pactuadas. A metodologia de cálculo é parte indissociável disso e sua alteração unilateral às esperas do fim de um contrato firmado há décadas representa violação da segurança jurídica e da boa-fé que devem nortear as relações contratuais”, disse o magistrado.
O relator também votou por não admitir a substituição do critério de cálculo de depreciação feita pela União, em um método alternativo àquele previsto no Decreto 4.119/1957, vigente à época dos fatos.
A previsão inicial era de que a depreciação fosse calculada para cada bem revertido, considerando sua vida útil estimada. Na forma alternativa adotada pela União, houve agrupamento de bens por funcionalidade e aplicação de médias de depreciação.
Para o ministro, a discricionariedade técnica invocada não pode fundamentar a criação unilateral e sem respaldo legal de um método simplificado para cálculo da depreciação. Ele reconheceu a ocorrência de prejuízo à Cesp.
“Esse método é particularmente prejudicial porque tem o condão de reduzir artificialmente o valor da indenização devida, ao considerar apenas os bens do projeto básico e desconsiderar investimentos posteriormente feitos, bem como depreciar inadequadamente terrenos que, por lei, não se depreciam.”
Coube ainda ao STJ decidir se a União deve pagar a indenização à Cesp em parcela única ou se será possível fazer o parcelamento. Na ausência de estipulação em contrato, entendeu o relator que a primeira opção deve prevalecer.
O parcelamento foi imposto em portaria do Ministério de Minas e Energia. “O adiamento do pagamento imporia à concessionaria duplo ônus: a perda imediata dos bens e a espera por compensação financeira”, explicou o ministro.
O relator também analisou um recurso especial da União, que foi parcialmente provido apenas para afastar a indenização pelo período em que permaneceu operando as usinas, entre o fim do contrato e a assunção do novo licitante.
Fonte: Consultor JUrídico - São Paulo / Jornal da Ilha - Ilha Solteira.